quinta-feira, 21 de maio de 2020

Um pouco de Poesia Simbolista

Acho que posso dizer que o Simbolismo é a minha escola literária favorita. Talvez seja até possível ver traços de certa influencia em algumas coisas que escrevo. Desde os tempos de colégio, foram os seus poemas carregados de misticismo, obscuridade e sinestesia os que mais me marcaram e mais se fixaram na minha memória através dos tempos. E eles continuam presentes. Trago alguns:



Universalidade (Roberto de Mesquita)

Pensais que os ermos jazem em repouso
E são uns cemitérios desolados,
E que as cousas, assim como os finados,
Permanecem num sono tenebroso?

Não! As florestas de cerrada frança,
Quando as cruza o tropel louco dos ventos,
Soltam um mesto coro de lamentos
Em que se afligem almas sem esp'rança...

No Outono, quando o campo está doente,
À vibração suave das trindades,
Passa à tona das cousas, vagamente,
Um tribo de anônimas saudades...

Quando as vozes da vida desfalecem
E a paz é triste e vasta como o mar,
Cheia de graça, a Lua vem falar
Aos corações eleitos que a conhecem




ELEVAÇÃO (Charles Baudelaire)


Por sobre os pantanais, os vales orvalhados,
As montanhas, os bosques, as nuvens, os mares,
Para além do ígneo sol e do éter que há nos ares,
Para além dos confins dos tetos estrelados,

Flutuas, meu espírito, ágil peregrino,
E, como um nadador que nas águas afunda,
Sulcas alegremente a imensidão profunda
Com um lascivo e fluido gozo masculino.

Vai mais, vai mais além do lodo repelente,
Vai te purificar onde o ar se faz mais fino,
E bebe, qual licor translúcido e divino,
O puro fogo que enche o espaço transparente.

Depois do tédio e dos desgostos e das penas
Que gravam com seu peso a vida dolorosa,
Feliz daquele a quem uma asa vigorosa
Pode lançar às várzeas claras e serenas;

Aquele que, ao pensar, qual pássaro veloz,
De manhã rumo aos céus liberto se distende,
Que paira sobre a vida e sem esforço entende
A linguagem da flor e das coisas sem voz!


Ai dos que vivem se não fora o sono
                                                    (Alphonsus de Guimaraens) 


Ai dos que vivem, se não fora o sono!
O sol, brilhando em pleno espaço, cai
Em cascatas de luz; desce do trono
E beija a terra inquieta, como um pai.

E surge a primavera. O áureo patrono
Da terra é sempre o mesmo sol. Mas ai
Da primavera, se não fora o outono,
Que vem e vai, e volta, e outra vez vai.

Ao níveo luar que vaga nos outeiros
Sucedem sombras. Sempre a lua tem
A escuridão dos sonhos agoureiros.

Tudo vem, tudo vai, do mundo é a sorte...
Só a vida, que se esvai, não mais nos vem.
Mas ai da vida, se não fora a morte!


Cárcere das Almas (Cruz e Sousa)


Ah! Toda a alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço olhando imensidades,
Mares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo o Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas e fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silêncios solitários, graves,
Que chaveiro do Céu possui as chaves
para abrir-vos as portas do Mistério?!



 Versos Íntimos (Augusto dos Anjos)


Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de sua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!


📜📜📜📖📖📖


Embriagai-vos!

Até!

***


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